segunda-feira, 12 de maio de 2008

A infestação da polícia

Três matérias, na edição de quinta-feira do Estado, deram uma boa amostra do ponto a que chegou a infestação da delinqüência no aparelho policial paulista. Primeiro, a notícia dos dois PMs da 3ª Companhia do 20º Batalhão Policial Militar do Interior, que teriam baleado um comerciante e seu amigo que estavam numa moto, na Rodovia Rio-Santos, em Ubatuba, causando a morte de um e a perda de 70% da visão do outro. No depoimento do sobrevivente, os dois policiais tinham sido vistos por ele - instantes antes da abordagem na estrada - bebendo em uma casa noturna, ocasião em que comentara com o amigo: "Como podem beber em serviço?" Mesmo em baixa voz a frase teria sido ouvida, e aí estaria o motivo da perseguição e ataque que lhes fizeram os dois policiais. Quer dizer, exibiu-se uma agressividade brutal sem razão alguma, a revelar a veia criminosa dos que não têm condição de portar arma de fogo e muito menos de cuidar da segurança dos cidadãos.

A segunda matéria foi sobre policiais civis de Mogi das Cruzes - um investigador e um delegado - que planejavam até a execução de um empresário que lhes recusava pagar propina. Escutas telefônicas, autorizadas pela Justiça, mostraram o diálogo entre estes profissionais da segurança pública, participantes de um esquema de achaque dentro do Grupo Armado de Repressão a Roubos (Garra), unidade de elite da Polícia Civil. Além deles, 16 pessoas - entre elas 11 policiais civis - foram denunciadas à 2ª Vara Criminal de Suzano por tomar dinheiro de proprietários de desmanches de veículos, casas de prostituição e máquinas caça-níquel.

A terceira matéria tratava da convocação, por parte da CPI dos Grampos na Câmara dos Deputados, do investigador Augusto Pena para depor sobre o esquema de escutas usado para achacar e seqüestrar parentes de integrantes da cúpula do Primeiro Comando da Capital (PCC). O policial, preso no dia 30, é a principal figura do escândalo que levou à queda do secretário-adjunto da Segurança Pública do Estado, Lauro Malheiros Neto. O requerimento para a convocação de Malheiros para depor fora retirado da pauta, a pedido do deputado Willian Woo (PSDB-SP), sob a alegação de que o ex-secretário-adjunto não tinha participação no esquema. "Decidimos ouvir Pena e os promotores de Guarulhos para depois decidirmos se convocamos ou não o ex-secretário", informou o relator da CPI, deputado Nelson Pelegrino (PT-BA).

Em dezembro do ano passado foi brutalmente assassinado o coronel José Hermínio Rodrigues, chefe da Polícia Militar na zona norte de São Paulo, quando passeava de bicicleta na Avenida Engenheiro Caetano Álvares, no Mandaqui. O coronel combatia o narcotráfico na região e os responsáveis por chacinas, pertencentes à própria corporação policial. No dia seguinte a seu assassinato houve o massacre de sete pessoas que, para o ouvidor da polícia paulista, Antonio Funari Filho, pareceu "uma espécie de celebração" da "execução" da véspera. Percebe-se, assim, que o processo de contaminação da estrutura da Segurança Pública paulista segue firme e forte.

Este é um setor para o qual meias medidas não funcionam. Sabemos que não é tarefa fácil, para o governo estadual, separar, com rigor, os verdadeiros agentes da Segurança Pública dos bandidos que infestam seus quadros. O volume de dinheiro que corre entre os membros do crime organizado, notadamente o que abrange produção e comercialização de drogas, é alto demais para confiarmos apenas na capacidade de resistência de policiais às tentativas de sua cooptação para ingresso no crime organizado. Mas não há como deixar de combater, com insistência, essa nefasta promiscuidade. É certo que o tamanho da "banda podre" do aparelho policial paulista ainda não se compara ao do Rio de Janeiro, que atingiu um ponto de difícil reversão. Mas vale todo o esforço para que a situação da Segurança Pública nos dois Estados não se equipare.

Para início de conversa, é preciso examinar o patrimônio de todos os que têm trabalhado no combate ao crime organizado, notadamente na repressão ao narcotráfico.


Estadão.

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