quarta-feira, 21 de maio de 2008

Jesus, Profeta

José María García-Mauriño *


Nós, cristãos, não somos seguidores de um líder religioso, mas seguimos um profeta leigo. Jesus foi um leigo. Nem foi sacerdote, nem funcionário da religião, nem nada parecido.

E mais: Jesus viveu e falou de tal maneira que, logo, entrou em conflito com os dirigentes religiosos de seu tempo, os sacerdotes e os funcionários do Templo, os representantes oficiais do "religioso" e do "sagrado".

A grande revolução religiosa levada a cabo por Jesus consiste em ter aberto aos seres humanos outra via de acesso a Deus, distinta a do sagrado. Isto é, a via profana da relação com o próximo, que não passa pela Lei. E a relação ética vivida como serviço ao próximo e levada até o próprio sacrifício.

Jesús abriu outra via de acesso a Deus a través de sua própria Pessoa, aceitando pagar com sua vida ao combater essa crença de que o culto religioso dos sacerdotes tinha o monopólio da salvação. A salvação vinha de outra parte.

Jesus denunciou os abusos do poder religioso e do poder político. "Jesus deixou assentado que o caminho a Deus não passa pelo Poder, nem pelo Templo, nem pelo Sacerdócio, nem pela Lei. Passa pelos excluídos da história." (González Faus.).

Um dos equívocos mais perigosos que a Igreja tem incorrido tem sido identificar a fé com a religião e com o sagrado. De forma que, para bispos, clérigos e fiéis incondicionais, ter fé é o mesmo que ser religioso, com uma religiosidade que tem seu centro no sagrado, isto é, no separado do profano e do leigo.

Além disso, o "religioso" e o "sagrado", quando visto como único verdadeiro, é o "privilegiado". Isto é, o que merece e deve ter direitos e privilégios que não estão ao alcance dos que praticam outras religiões, pelos agnósticos e pelos ateus. É o que eles dizem.

Nós cremos que a comunidade de crentes deve acabar com os privilégios da Igreja. E isto é importante por motivos jurídicos, sociais e políticos; porém, é importante também por razões estritamente teológicas. A Igreja tem sua origem em Jesus. E sua primeira preocupação tem que ser a de tentar viver e falar como viveu e falou Jesus.

Resulta significativo e estranho que sempre que os Evangelhos mencionam os Sumos Sacerdotes é para apresenta-los como agentes de sofrimento e de morte. E na Parábola do Bom Samaritano, a Jesus não lhe ocorreu outra coisa do que apresentar como modelo de humanidade solidária a um herege e infiel (o samaritano), enquanto que foram precisamente os representantes oficiais da religião que passaram ao largo diante do sofrimento humano.

O samaritano andava mal de religião, porém tinha humanidade. E isso é o que Jesus destaca. Nisso centrava-se sua grande preocupação. Para Jesus era mais importante "o humano" do que "o religioso" e "o sagrado".

O humano é "o leigo", o comum a todos. "Leigo" vem do termo grego "laos", o "povo". E está claro que Jesus antepôs o leigo ao religioso.

Quando Jesus, na Boda de Caná, converteu a água em vinho, não utilizou uma água qualquer, mas precisamente aquela que tinham na casa "para as purificações rituais". Isto é, Jesus converteu o enorme e pesado ritual religioso (6 vasilhas de pedra de uns 100 litros cada uma) no melhor vinho, para que a festa, a alegria e o desfrute da vida não se acabasse. Isto é o próprio do Reino de Deus, a felicidade e a alegria para todas e todos. Jesus antepôs sempre o humano e o leigo ao religioso e ao sagrado.

Chama a atenção o caráter tão pouco "religioso", em termos daquela época, que Jesus atribui ao Reinado de Deus. Não gira em torno ao Templo, nem são prescritos sacrifícios ou atos de culto. Tampouco existem funções sacerdotais nem pessoas que atuem como intermediárias.

Sem dúvida que Deus está muito no centro dessa mensagem que leva seu nome. Porém, é um Deus deslocado dos lugares sagrados. Agora, encontra-se em plena voragem da vida, sobretudo de pessoas e coletivos marginalizados: as crianças, os enfermos, os arrecadadores de impostos, as prostitutas, os pobres, deficientes, cegos e coxos... E se identifica com as tarefas cotidianas feitas pelas pessoas em sua vida diária: o semeador, o pastor, a pesca, a mulher que amassa a farinha de trigo ou que limpa sua casa...

Essa identificação com o ser humano, com sua felicidade, com seu sofrimento e com sua marginalização, permite ao Reinado de Deus superar os limites culturais e religiosos em que o próprio Jesus viveu. Por isso, mantém uma universalidade, uma modernidade e uma "laicidade" atual.


[Enviado por Panamá Profundo]

* Fe Adulta - www.feadulta.com

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