sexta-feira, 9 de maio de 2008

Mudanças no processo penal

Com o objetivo de agilizar a tramitação das ações criminais, o Senado aprovou na semana passada cinco projetos que alteram vários dispositivos do velho Código de Processo Penal, editado em 1941, e que deverão ser submetidos à apreciação da Câmara dos Deputados. Dos cinco projetos, três vieram do Executivo e dois são de autoria de senadores. Eles foram apresentados após os ataques do PCC, em 2006 em São Paulo, e do assassinato do menino João Hélio Vieites, no Rio de Janeiro, em fevereiro de 2007.

Os dois acontecimentos chocaram a opinião pública e vários movimentos sociais, mobilizados pelas famílias das vítimas, passaram a reclamar medidas mais rigorosas em matéria de combate à violência. Para aplacar o clamor da opinião pública, deputados e senadores apresentaram dezenas de propostas para aumentar o rigor das punições previstas pelo Código Penal. Só no ano passado, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado votou 33 projetos com esse objetivo. Muitos foram redigidos às pressas, contendo falhas jurídicas. Além disso, preocupados em aparecer na mídia, parlamentares passaram a disputar acirradamente a paternidade dos projetos.

Para evitar o risco de aprovação de propostas com graves vícios legais e acabar com as disputas entre parlamentares pela autoria dos projetos, as lideranças partidárias, de acordo com as Mesas das duas Casas Legislativas, selecionaram os projetos mais importantes, que teriam tratamento prioritário no Senado e na Câmara. Com isso pretendeu-se evitar que a disputa pelos dividendos políticos da modernização da legislação penal desfigurasse os projetos.

Os cinco projetos aprovados pelo Senado fizeram parte desse acordo. Até julho do ano passado, coube ao senador Antonio Carlos Magalhães (DEM-BA), então presidente da CCJ, coordenar a tramitação dessas propostas. Com sua morte, a função foi assumida pela senadora Ideli Salvatti (PT-SC). Entre as medidas aprovadas, uma das mais oportunas suspende o prazo de prescrição nas ações dos tribunais superiores contra réus com direito a foro privilegiado. De autoria do senador Eduardo Suplicy (PT-SP), ela tem por objetivo evitar os recursos protelatórios que permitem a extinção dos processos sem julgamento de mérito. Também foram aprovados projetos que agilizam o processo penal, como o que substitui procedimentos escritos por procedimentos orais e o que permite tramitação especial nos casos de absolvição sumária, evitando longa demanda processual quando não há provas materiais contra o acusado.

O projeto mais importante é o que revoga o direito dos réus condenados por homicídio de exigir a realização de um novo júri, quando a pena aplicada for superior a 20 anos. Justificado pelos criminalistas em nome do ''garantismo processual'', esse recurso permite que criminosos violentos aguardem em liberdade novo julgamento e propicia situações que desmoralizam a Justiça, como acaba de ocorrer no Pará, com a absolvição do fazendeiro Vitalmiro Bastos Moura. Acusado de mandar matar a missionária Doroty Stang, em 2005, ele foi condenado a 30 anos de prisão pelo primeiro júri a que se submeteu, em maio de 2007. Graças ao direito automático a um novo julgamento, ele foi surpreendentemente absolvido pelo segundo júri, nesta semana. Para evitar que isso aconteça, os juízes criminais há muito tempo vêm aplicando penas inferiores a 20 anos a homicidas que deveriam receber punições muito mais rigorosas.

Mas entre as medidas aprovadas também há algumas de escassa viabilidade. Uma concentra a tomada de depoimentos de testemunhas de acusação e defesa em uma única audiência. A medida esbarra na freqüente impossibilidade de se reunir várias testemunhas, às vezes procedentes de diversos locais, num só dia. Outra, é a que dá preferência de tramitação e julgamento às ações penais contra servidores públicos. Proposta pela senadora Ideli Salvatti, a medida tem viés corporativo e fere o princípio da isonomia.

As maiores críticas aos projetos vieram de advogados, que receiam perder trabalho com a modernização do processo penal. Alegam que a agilização das ações penais compromete a defesa ampla e o contraditório. Mas essas garantias continuam em vigor.


Estadão.

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