segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Jurisprudência - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - Novembro 2009

Processo penal. Operação “grandes lagos”. Gerente da organização. Ausência de individualização mínima de sua conduta. Inépcia da denúncia.

“1. Embora seja prescindível, nos crimes de autoria coletiva, a descrição minuciosa e individualizada da conduta de cada acusado, não se pode conceber que o órgão acusatório deixe de estabelecer qualquer vínculo entre o denunciado e a empreitada criminosa a ele imputada. 2. A ausência absoluta de elementos individualizados que apontem a relação entre os fatos delituosos e a autoria ofende o princípio constitucional da ampla defesa, tornando, assim, inepta a denúncia. 3. Ordem concedida para, reconhecendo a inépcia da denúncia com relação à Paciente, determinar o trancamento da ação penal em seu favor, sem prejuízo do oferecimento de nova peça acusatória, com observância do disposto no art. 41 do Código de Processo Penal” (STJ - 5ª T. - HC 86715/SP - rel. Laurita Vaz - j. 15.09.2009 - DJe 05.10.2009).

Anotação: Os crimes societários, como a sonegação de tributos, envolvem condutas de diversas pessoas físicas e acarretam responsabilidade em mais de uma esfera jurídica. Abrem-se duas vias de responsabilização: a penal e a tributária. Nesta, embora a regra seja a responsabilização da pessoa jurídica, é comum o redirecionamento da execução para diretores e gerentes com fundamento na fraude à lei sem necessidade de descrição individualizada das condutas dos envolvidos. (STJ – AReg 1163237 / PR - Mauro Campbell Marques - j. 22.09.2009, DJe 30.09.2009).Todavia, o mesmo raciocínio não pode ser aplicado à esfera penal, cuja responsabilidade atinge diretamente o indivíduo que integra a organização. É verdade que alguns julgados entendem que nos crimes de autoria coletiva é prescindível a descrição minuciosa da ação de cada acusado, mas é inadmissível que a denúncia não apresente o nexo de causalidade conduta e delito. Com efeito, o artigo 41 do CPP exige, como um dos requisitos da denúncia, a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias. Uma acusação genérica viola este preceito e, ao fazê-lo, torna-se eivada do vício da inépcia formal por não possuir os requisitos indispensáveis ao seu recebimento. Isso porque o direito brasileiro adota o sistema da responsabilidade subjetiva. Assim, nos delitos de resultado, em que há uma conduta positiva, é indispensável a demonstração da relação de causalidade. Já nos omissivos, conquanto não haja causalidade, vigora o princípio da imputação, donde se extrai que a descrição exata da relação entre conduta e o delito é fulcral. (Luis Regis Prado, Curso de Direito Penal Brasileiro, Vol. I: parte geral, 6ª Ed., São Paulo, RT, 206, p. 135, 303 e 308). Outrossim, o direito à defesa consagrado no artigo 5º, inciso LV da CF assegura ao acusado o pleno conhecimento da imputação que a ele é feita, de modo a contradizê-la da melhor forma possível.

Fernanda Vilares

Penal. Inundação e crime ambiental. Delito omissivo. Ausência da posição de garante. Atipicidade da conduta.

“Para que um agente seja sujeito ativo de delito omissivo, além dos elementos objetivos do próprio tipo penal, necessário se faz o preenchimento dos elementos contidos no art. 13 do Código Penal: a situação típica ou de perigo para o bem jurídico, o poder de agir e a posição de garantidor. Ausente um dos elementos indispensáveis para caracterizar um agente sujeito ativo de delito omissivo – poder de agir –, previstos no art. 13 do Código Penal, falta justa causa para o prosseguimento da ação penal, em face da atipicidade da conduta. Ordem concedida” (STJ - 5ª T. - HC 94.543 - rel. Arnaldo Esteves Lima - j. 17.09.2009 - DJe 13.10.2009).

Penal. Vistoria em acidente marítimo. Imputação objetiva. Ausência de incremento do risco por parte do engenheiro naval contratante.

“Para que o agente seja condenado pela prática de crime culposo, são necessários, dentre outros requisitos: a inobservância do dever de cuidado objetivo (negligência, imprudência ou imperícia) e o nexo de causalidade. No caso, a denúncia imputa ao paciente a prática de crime omissivo culposo, na forma imprópria. A teor do § 2º do art. 13 do Código Penal, somente poderá ser autor do delito quem se encontrar dentro de um determinado círculo normativo, ou seja, em posição de garantidor. A hipótese não trata, evidentemente, de uma autêntica relação causal, já que a omissão, sendo um não-agir, nada poderia causar, no sentido naturalístico da expressão. Portanto, a relação causal exigida para a configuração do fato típico em questão é de natureza normativa. Da análise singela dos autos, sem que haja a necessidade de se incursionar na seara fático-probatória, verifico que a ausência do nexo causal se confirma nas narrativas constantes na própria denúncia. Diante do quadro delineado, não há falar em negligência na conduta do paciente (engenheiro naval), dado que prestou as informações que entendia pertinentes ao êxito do trabalho do profissional qualificado, alertando-o sobre a sua exposição à substância tóxica, confiando que o contratado executaria a operação de mergulho dentro das regras de segurança exigíveis ao desempenho de sua atividade, que mesmo em situações normais já é extremamente perigosa. Ainda que se admita a existência de relação de causalidade entre a conduta do acusado e a morte do mergulhador, à luz da teoria da imputação objetiva, seria necessária a demonstração da criação pelo paciente de uma situação de risco não permitido, não-ocorrente, na hipótese. Com efeito, não há como asseverar, de forma efetiva, que engenheiro tenha contribuído de alguma forma para aumentar o risco já existente (permitido) ou estabelecido situação que ultrapasse os limites para os quais tal risco seria juridicamente tolerado” (STJ - 6ª T. - HC 68.871 - rel. Og Fernandes - j. 06.08.2009 - DJe 05.10.2009).

Penal. Pena fixada em patamar inferior aos 4 anos de reclusão. Disciplina da Lei 11.464/07, no tocante ao regime de cumprimento de pena, descartada. Regime aberto. Ambiente deletério à recuperação da condenada.

“Verifica-se que o delito fora praticado em 04/10/2007, quando a Lei nº 11.464/2007, que instituiu o regime inicial fechado aos crimes hediondos e assemelhados, já se encontrava em vigor. Contudo, o cumprimento de pena de curta duração em ambiente deletério é prejudicial à recuperação da condenada. O raciocínio a ser utilizado é o mesmo para a concessão do sursis, cabível nas hipóteses de pena inferior a 2 (dois) anos. Na situação em análise, na qual a paciente ostenta circunstâncias judiciais favoráveis, tendo sido condenada a cumprir pena de 01 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão, o regime prisional, à luz do artigo 33, § 2º, alínea “c”, deve ser o aberto. Ordem concedida para estabelecer à paciente o regime inicial aberto para o cumprimento de sua pena reclusiva” (STJ - 6ª T. - HC 128.889 - rel. Celso Limongi - j. 24.08.2009 - DJe 05.10.2009).

Processo penal. Acórdão que confirma decisão de pronúncia. Vício do texto. Excesso de linguagem. Determinação de desentranhamento dos autos.

“A fase do denominado judicium accusationis implica juízo objetivo acerca da materialidade do delito, dos indícios e provas da autoria e da descrição das teses existentes, não podendo construir valoração favorável a uma delas em frontal desprestígio da outra. In casu, ao preconizar o julgador a existência de duas teses contrapostas, a da acusação e a da defesa, esta na linha da legítima defesa, jamais poderia afirmar categoricamente que a conduta do acusado decorreu de “discussão banal” e, mesmo que assim não fosse, estaria configurado “excesso em sua conduta”; ou, ainda, que praticou o fato com “frieza” e “sem nervosismo”, porque tais adjetivações transbordam o juízo de pronúncia. (...) Ordem concedida em parte para (...) que seja o acórdão proferido no julgamento do recurso em sentido estrito desentranhado dos autos da ação penal, de modo a evitar o seu conhecimento por parte dos jurados” (STJ - 6ª T. - HC 89.523 - rel. Maria Thereza de Assis Moura - j. 13.08.2009 - DJe 31.08.2009).

Jurisprudência compilada por
Leopoldo Stefanno Leone Louveira

Boletim IBCCRIM nº 204 - Novembro / 2009

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